Há uma solidão particularíssima.
Não é a dos que ficaram sozinhos, mas a dos que se tornaram refúgio demais para o outro.
É a solidão do território invadido que, em sua generosidade patológica, esqueceu de demarcar uma fronteira para si.
Nesse jogo de espelhos, ele se ofereceu como a casa onde o outro habita.
Abriu todas as portas, mostrou cada cômodo, serviu cada refeição. No entanto, houve um detalhe arquitetônico negligenciado: não há um quarto para ele.
Não há um espaço inviolável, um lugar onde suas opiniões, seus desejos mais secretos e seu cansaço possam simplesmente ser, sem a necessidade de se disfarçarem em mobília para agradar o hóspede.
E ele, o sujeito-território, num dia qualquer, se surpreende ao se sentir um estrangeiro em sua própria pele, coadjuvante na sua história.
Olha-se no espelho e vê o gesto, o sorriso, a paciência que o outro espera, mas não reconhece mais o rosto que os sustenta.
A vida nos ensina que não há amor possível quando um sujeito se reduz a um objeto para o outro.
O sujeito que se fez coisa nunca se sentirá admirado, valorizado ou amado mas afinal, como poderia?
Um afeto, para ser experimentado como afeto, precisa encontrar a legitimidade de um “eu” para acolhê-lo.
Sem esse “eu” para contê-lo, o amor escorrerá como água num recipiente quebrado, onde deixará apenas o vazio e a sensação de que nada lhe pertence.